
Segundo Freud, o eu psíquico tem uma energia sexual permanente (a libido), e parte dela é transmitida a objetos (amados ou odiados, segundo os investimentos afetivos), "assim como o corpo de uma ameba está relacionado com os pseudópodos que produz" (Sobre o narcisismo: uma introdução, 1914).
Num artigo posterior, ele explica melhor a comparação: o ego é um reservatório, de onde a libido vai em direção aos objetos e para onde retorna, de volta dos objetos. Como ele diz neste texto, a situação pode ser ilustrada por uma ameba, pois seu corpo emite pseudópodes, prolongamentos que se podem retrair a qualquer momento, de modo que a forma da massa protoplásmica seja restaurada. A libido do ego pode converter-se em libido objetal, e esta pode reconverter-se em libido do ego. "Para a completa sanidade, é essencial que a libido não perca essa mobilidade", remarca Freud (Uma dificuldade no caminho da psicanálise, 1917).

Diz logo que esses prolongamentos são a afluência de libido em direção aos objetos, enquanto a massa principal de libido permanece no ego. Em circunstâncias normais, essa libido do ego pode transformar-se em libido objetal com relativa facilidade, e inversamente esta pode novamente ser devolvida ao ego ("A teoria da libido e o narcisismo", 1917).
Neste último texto, a explicação serve para entender estados psíquicos tão diversos como o sono, o luto e a melancolia, as paixões amorosas, a demência precoce, as doenças orgânicas, o homossexualismo e a hipocondria. Mas não convém tomar literalmente a comparação com os protozoários, até porque o mesmo Freud reformulará em parte seus conceitos sobre o ego e o id. As amebas terão uma última e breve menção, no cap. 2 de "Esboço de Psicanálise" (1938).
Ainda seguindo o texto ao pé da letra, a analogia sugere duas manifestações contrapostas:
- a libido do ego, situada no corpo (autoerotismo), é como uma bola (um tirano gordo e socialmente insuportável, pois monopoliza o amor), e
- a libido objetal, contida nos membros (desejo amoroso voltado a outros), é a ameba com pés, agarrando as coisas de que gosta.

- dentro da origem (egocentrismo),
- em direção à periferia do ego (buscando amar ou odiar), ou
- de retorno ao ego (retração depressiva, em casos como perdas e separações).
Ficamos admirados com essas mudanças animais, talvez por serem movimentos psíquicos como os que nós mesmos fazemos, de ida e de volta. No narcisismo, não amamos nem odiamos ninguém fora de nós mesmos. No apaixonamento, adoramos com tal facilidade um objeto externo que nosso ego parece ter desaparecido. No desapaixonamento, a retração dói bem mais.
A patologia aparece quando esse vaivém se paralisa. Quando se perde o objeto amado, sobre o qual o ego havia jogado seus braços, a libido investida pode não retornar ao ego. A pessoa se sente podre, como se tivesse "engolido" o objeto morto. Sem retrair os pseudópodes, o ego não consegue reconhecer-se como vivo, pleno, estimável, prazeroso, independente. Segundo outra imagem freudiana, o ego em depressão sente cair sobre ele a sombra do objeto perdido (Luto e melancolia, 1915).

Será este mecanismo narcisista exclusivo dos homens? É preciso tomar cuidado, então, com toda pessoa que aplica ao namoro as regras psicanalíticas de abstinência, neutralidade e regressão narcísica, que só deterioram com mais angústias a relação com o outro. Serve para a análise, mas não para a vinculação amorosa.
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